26/11 – LÍNGUA PORTUGUESA – 9º ANO
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| A TERCEIRA MARGEM DO RIO Nosso pai era homem cumpridor, ordeiro, positivo; e sido assim desde mocinho e menino, pelo que testemunharam as diversas pessoas sensatas, quando indaguei a informa- ção. Do que eu mesmo me alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos. Só quieto. Nossa mãe era quem regia, e que ralhava no diário com a gente - minha irmã, meu irmão e eu. Mas se deu que, certo dia, nosso pai mandou fazer para si uma canoa. Era a sério. Encomendou a canoa especial, de pau de vinhático, pequena, mal com a tabuinha da popa, como para caber justo o remador. Mas teve de ser toda fabricada, escolhida forte e arquejada em rijo, própria para dever durar na água por uns vinte ou trinta anos. Nossa mãe jurou muito contra a idéia. Seria que, ele, que nessas artes não vadiava, se ia propor agora para pescarias e caçadas? Nosso pai nada não dizia. Nossa casa, no tempo, ainda era mais próxima do rio, obra de nem quarto de légua: o rio por aí se estendendo grande, fundo, calado que sempre. Largo, de não se poder ver a forma da outra beira. E esquecer não posso, do dia em que a canoa ficou pronta. Sem alegria nem cuidado, nosso pai encalcou o chapéu e decidiu um adeus para a gente. Nem falou outras palavras, não pegou matula e trouxa, não fez nenhuma recomendação. Nossa mãe, a gente achou que ela ia esbravejar, mas persistiu somente alva de pálida, mascou o beiço e bramou: - "Cê vai, ocê fique, você nunca volte!" Nosso pai suspendeu a resposta. Espiou manso para mim, me acenando de vir também, por uns passos. Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: - "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" Ele só retornou o olhar em mim, e me botou a bênção, com gesto me mandando para trás. Fiz que vim, mas ainda virei, na grota do mato, para saber. Nosso pai entrou na canoa e desamarrou, pelo remar. E a canoa saiu se indo - a sombra dela por igual, feito um jacaré, comprida longa. Guimarães Rosa, J. Ficção Completa. Rio de Janeiro, Ed. Nova Aguilar, 1994, p. 409. |
Sobre o Texto , só NÃO podemos dizer que:
(A) apresenta cenário rural em que se percebem elementos arcaizantes.
(B) possui narrador de primeira pessoa que se mostra consciente de que seu narrar provém da memória.
(C) mostra, na figura feminina, traços da herança matriarcal.
(D) pretende reproduzir o linguajar dos habitantes da região retratada.
(E) desenha, com precisão, as características físicas, morais e psicológicas dos personagens.
Indique a opção em que há uma quebra da regência tradicional do verbo, ampliando as possibilidades de significados e observando os acontecimentos da história.
(A) "Ele só retornou o olhar em mim." (l. 32)
(B) "Nosso pai nada não dizia." (l. 16-17)
(C) "Encomendou a canoa especial..." (l. 10)
(D) "O rumo daquilo me animava..." (l. 30)
(E) "Nosso pai suspendeu a resposta." (l. 27-28)
Segundo o Texto , na visão do menino:
(A) a mãe era uma pessoa brava e enérgica; o pai, metódico e calado.
(B) a mãe não aprovava a idéia de ver o marido levar o filho para caçadas e pescarias.
(C) a mãe era a responsável pela saída do pai.
(D) o pai o abandonou, porque não gostava dele.
(E) era bom viajar com o pai, mas era melhor ficar no aconchego do lar.
Em a terceira margem do rio, a história segue o estilo típico de Guimarães Rosa. A oralidade é reproduzida na voz do narrador. Observe o trecho:
“Do que eu mesmo em alembro, ele não figurava mais estúrdio nem mais triste do que os outros, conhecidos nossos (…) Só quieto. Nossa mãe era quem ralhava no diário com a gente.”
Reescreva o trecho passando para norma culta da língua portuguesa modificando o que está em destaque e fazendo alterações no que for necessário.
Após a leitura e reflexão do conto, e tendo em vista o seu desfecho o que vem a ser “a terceira margem do rio”? Que metáforas há nesse conto?
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